Em minha trajetória como colaboradora, líder e consultora, percebi que muitos níveis de chefias mais atrapalham e emburrecem a organização como um todo do que trazem valor agregado aos envolvidos – ao cliente, principalmente. Minha intenção neste texto é demonstrar que é possível haver organizações sem chefes – e vou te mostrar como.
Para entendermos se é possível ou não, precisamos antes avaliar as principais responsabilidades destes. Um chefe deveria, em verdade, ser exemplo de liderança, focando em três principais atividades. A primeira é manter os colaboradores focados na direção da organização – ou seja, criar e/ou focar ações dos times na visão ou propósito organizacional, gerando entendimento sobre a estratégia, os objetivos e as metas do negócio.
Outro papel importante é o de inspirar os colaboradores a caminharem nesta mesma direção. Isto exige o estabelecimento de relações pautadas pela prática dos valores da empresa, habilidade de entender e ser entendido nas individualidades e motivações e construção de relações de confiança. A terceira função seria mobilizar os times para a realização eficiente dos objetivos e metas.
Isso exige que os líderes deixem claros quais os resultados desejados, ajudem a identificar e remover barreiras que impeçam a ação, gerenciem desempenho, alinhem os sistemas da organização para apoiar o progresso e façam uso das habilidades de todos com a prática de time.
Em uma empresa sem chefes, essas três principais responsabilidades passam para todos os colaboradores. Além disso, existem três pontos, tratados por Daniel Pink em seu livro Motivação 3.0, que se não
praticados impedem de transformar uma empresa em uma organização sem chefe: autonomia, maestria e
propósito. Portanto, é necessária uma estratégia inteligente de mudança.
Começa-se por capacitar o time para tomada de decisão, com informações do negócio: como a empresa gera valor ao cliente, quem é o cliente e porque ele é importante, para onde a empresa quer ir e porque, qual a razão de existir da
empresa. Como todos os seres humanos têm a capacidade de aprender, os colaboradores podem tomar decisão a favor do melhor para o negócio e o cliente.
Integrar os membros de todos os times criando equipes multifuncionais, no qual as pessoas precisam ser
capacitadas para desenvolver o outro, entender e estimular as motivações uns dos outros, trabalhar a
complementariedade e especialmente fazer do feedback uma ferramenta poderosa de desenvolvimento
mútuo. E por fim, mobilizar todos para a ação que agregue valor e faça a empresa caminhar para a direção
definida. Isto demanda capacitação para entendimento do fluxo de valor pela visão do cliente, melhoria e
aprendizados contínuos.
O resultado de um time integrado é exponencialmente maior do que a soma dos resultados
individuais. Assim, cria-se uma organização que aprende.
E o que os líderes vão fazer depois de capacitarem todos a serem interdependentes, responsáveis mutuamente pelo constante desenvolvimento e orientados em trazer o melhor resultado para todos? Tarefas não faltam.
Uma é focar na inovação, investigando a possibilidade inovação e/ou disrupção criando outros negócios ou trazendo a tecnologia para dignificar o trabalho humano – e não controlá-lo. Outra é atuar na redução de desperdícios, removendo tudo que é desnecessário e impede os colaboradores de darem o seu melhor: políticas de gestão de processos e pessoas burocratizantes e corruptoras (como comissão de vendas e remuneração variável) e estruturas desnecessárias (física e organizacional) que minam a transparência e fluidez de informações.
Ter uma empresa sem chefes é admirável do ponto de vista do cliente, do colaborador e do investidor, é simples. O que é complicado é o desapego ao poder dado pelo status do cargo. Desde sua fundação, em 2002, a Muttare trabalha com processos de transformação organizacional. Nossa experiência mostra que, sim, um bom trabalho de transformação pode eliminar cargos de chefia desnecessários e aprimorar a produtividade e o engajamento dos colaboradores.
Por Roberta Yono Ebina, sócia diretora da Muttare Consultoria